terça-feira, maio 16, 2006
Esvaimento
Não tive tempo. Estes anos todos e nunca tive tempo. Ando há que tempos para ter tempo, pelo menos este tempo que é preciso para podar as árvores de fruto que plantei de cada vez que pensei. O pomar, selvagem, vai-se governando sozinho entre ervas altas e bicharada, sujeito a intempéries sem auxílio nenhum da minha parte. Os frutos que resistem e amadurecem caem com estrondo na terra e eu não percebo. Não percebo este tempo que nunca tive, nem estes frutos que crescem sem desbastamentos e sem colheitas. Como se fosse possível pensar sem saber exactamente em que ramo reter-se, em que nó ligar os vários raciocínios. Sem este tempo que nunca tive, pensar é como arranhar-se em cavacos inúteis e esvair-se nessas feridas microscópicas que se abrem dentro.
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