terça-feira, abril 19, 2011

Terra Prometida


inútil dizer: o deserto é rosto afogueado de mulher iminência de revelação constelada apocalipse imenso do braseiro; o deserto é ar e areia ar e areia quente e seco;
para lá das areias do Kalahari crescem as árvores brancas: marula, terebinto, espinheiro, imbondeiro - depois da encosta ardente surgem os limites do purgatório
Joanesburgo!
cidade erguida fora do constrangimento terráquio espelho e planalto de luz alterada; atrás das colunas dos geradores eléctricos brancas fábricas torres chaminés lançam-se ao assalto do céu cuspindo labaredas que explodem no azul: ur-tambores de morte…
é o inferno sem Deus
Deus o bureau da Segurança do Estado
Deus de capacete e pasta cheia de ouro e acções selada presa a um braço e no ouro braço o chicote Deus erecto em toda a sua lustrosa glória sobre dorsos de negros imersos no pó
uma granada!
corações vermelhos hão-de rebentar e levar esta sarça ao fogo (convem tirar os sapatos e rastejar sem deixar marcas…)

Enquanto Houver Água na Água e outros poemas, de Breyten Breytenbach tradução de Mário Cesariny, D.Quixote, 1979

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