sexta-feira, outubro 16, 2009

as hesitações do nómada

Uma partida é um tempo que separa outro, que vai mudar tudo, mas é ao mesmo tempo uma continuidade. Em todas estas deslocações e turbilhões o compromisso é, ao estar num lugar, vivê-lo intensamente, tornamo-nos uma espécie de Caramuru que casa com Paraguaçu, filha de um dos chefes dos tupinambás, e passa a dominar a sua língua e costumes.

A distância é condição para pensar e agir, não um afastamento de si. Muitas vezes queria não estar aqui, queria estar junto dos meus amigos e dizer-lhes como vale a pena essa prisão. Mas as relações à distância tornam-se outra coisa diferente de relações à distância. Uma amizade carinhosa e próxima pelo teor dos afectos e ideias que se querem partilhar. Chega uma altura em que a única forma que temos de rever a pessoa é pensar nela pelos episódios que vivemos mas também pelas palavras que entretanto deram nomes a sentimentos e explicarem fenómenos que são imperceptíveis quando estamos numa cultura de nos vermos fisicamente mas em nada frontal. Sinto as pessoas a crescer à distância e gosto de imaginar e ir sabendo da forma como organizam e desfrutam a sua vida, quase que ganho mais respeito pelos seus propósitos privados.

Depois há a história dos regressados que voltam à história, a si próprios, e terão ou não a capacidade de compreender o que lhes aconteceu. E o que é mais estranho, é que aí se dá também o encontro com o Outro. A cada paragem no desejado e atribulado regresso a casa, encontra-se o diferente - nada mudou que se veja mas há desadequações incuráveis em nós. Medo, a dificuldade de compreensão, conflito, alegria, espanto, ter de conquistar. Os mesmos elementos com que nos deparamos numa terra nova. Não adianta contar nada sobre a vida noutro país, seria o mesmo de contar como é a vida noutro planeta: para as pessoas tanto faz, pode existir como pode não existir. E a grande riqueza nesse acréscimo de experiências fica, com a inutilidade de partilha, assim meio patética dentro de nós, transforma-se em sonho, alucinação, e vontade de voltar de novo a outros mundos.


1 comentário:

Ausente disse...

Adoro este teu cantinho...e não consegui responder ao teu comentário...ainda não estou habituado a usar "isto"...

Que faço em Luanda?As vezes não sei...mas tenho o tempo o tempo todo ocupado...nem que seja a andar apenas por ai.

Esta semana andei 4h por dia a pé...todos os dias...por ai. Há mta coisa para ver nestas ruas...e tanta coisa a acontecer. E eu adoro andar pelo meio disso tudo, deslizando por ai...parando as vezes para ganhar folego, para me familiarizar com uma esquina qq em particular.. e dps sigo outra vez...a errância...

Escrevia mais...mas o povo todo vai ler...