Outros antes de nós tentaram o mesmo esforço: dente por dente: não, nunca olhar de soslaio e manter a cabeça escarlate, o vómito nos pulsos por cada noite roubada; nem um minuto para a glória da pele. Despertar de lado: olho por olho: conservar a família em respeito, a esperança à distância de todas as fomes, o corno de cada dia nos intestinos. Aos dezoito anos, aos vinte e oito, a vida posta à prova da raiva e do amor, os olhos postos à prova do nojo. Entrar de costas no festivaI das letras, abrir passagem a golpes de fígado para a saída do escarro. Se não temos saúde bastante sejamos pelo menos doentes exemplares.
Fora do meu reino toda a pobreza, toda a ascese que gane aos artelhos dos que rangem os dentes; no meu reino apenas
palavras provisórias, ódio breve e escarlate. Nem um gesto de paciência: o sonho ao nível de todos os perigos. Pelo meu relógio são horas de matar, de chamar o amor para a mesa dos sanguinários.
Dente por dente: a boca no coração do sangue: escolher a tempo a nossa morte e amá-Ia.
António José Forte, Uma Faca nos Dentes
2 comentários:
e o editor costumava trazer umas preciosidades para venda, aos sábados de manhã no chiado.
Dente por dente para uma boca impossível. Possíveis são todos os desejos dessa boca. António José, Forte e áspero o texto.
Venho de terras distantes, do Brasil, deixar um aceno de redescobrimento. Deixo aqui minha estranheza aproximada.
Parabéns pela vida escrita aqui, Marta.
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