Em Alice nas cidades de Wim Wenders, a dada altura, o encurralado fotógrafo das desoladas paisagens americanas, deixa-se por sua vez fotografar pela pequena Alice, que toma a máquina polaroid nas suas mãos. Depois de o retratar, ela diz-lhe: «Assim ao menos sabes como és». Quando, logo em seguida, o fotógrafo observa a sua própria imagem, maneja talvez para lá do admissível a inclinação da fotografia. Talvez não estivesse tão desamparado. Ainda sabe inclinar-se. Assim, a superfície parcialmente espelhada da polaroid devolve-lhe o reflexo insistente, se bem que fugidio, da miúda, que instavelmente se sobrepõe ao seu. Porque uma imagem não manejada, quer dizer, tomada sem atenção, dar-lhe-ia o reflexo da miúda meramente invertido (na vertical). Vemos que é preciso procurar. Uma procura que tem de ser desatenta, no entanto.
Talvez a experiência do confronto à imagem de uma infância, por exemplo, da mulher que se ama, nos diga algo de concordante. Se tomarmos em mãos fotografias de outras infâncias, reparamos que estas nos dizem mais do que a nossa, tão miseravelmente umbilical. A não ser que a tomemos como uma qualquer, gesto não tão fácil. Há algo de irremediável numa infância. Diz-nos pelo menos o mundo sem a nossa mancha. Como não pasmar perante ela?
Por isso me exaspera, para lá do razoável, a multiplicação das imagens das infâncias. Não há hoje criança que não esteja, sobrecarregada de toneladas de kilobytes de desgastantes imagens, segura a mastros a que se agarrar quando o maelstrom de quem é a tormentar. Não lhe dirão nada. Estão lá simplesmente a mais. Feitas para um mau silêncio. Uma impressão de falsa coexistência consigo própria. Para nos dizer alguma coisa, não há melhor que o vazio, o nada... ou então o bom reflexo, essa outra pessoa cuja imagem nos atravessa, faz sombra e nos devolve o caminho.
Talvez a experiência do confronto à imagem de uma infância, por exemplo, da mulher que se ama, nos diga algo de concordante. Se tomarmos em mãos fotografias de outras infâncias, reparamos que estas nos dizem mais do que a nossa, tão miseravelmente umbilical. A não ser que a tomemos como uma qualquer, gesto não tão fácil. Há algo de irremediável numa infância. Diz-nos pelo menos o mundo sem a nossa mancha. Como não pasmar perante ela?
Por isso me exaspera, para lá do razoável, a multiplicação das imagens das infâncias. Não há hoje criança que não esteja, sobrecarregada de toneladas de kilobytes de desgastantes imagens, segura a mastros a que se agarrar quando o maelstrom de quem é a tormentar. Não lhe dirão nada. Estão lá simplesmente a mais. Feitas para um mau silêncio. Uma impressão de falsa coexistência consigo própria. Para nos dizer alguma coisa, não há melhor que o vazio, o nada... ou então o bom reflexo, essa outra pessoa cuja imagem nos atravessa, faz sombra e nos devolve o caminho.
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