terça-feira, maio 23, 2006

Deslugar

Um dos burros brancos do meu tio Manuel irritava-se quando partíamos do princípio que ele já sabia o caminho para casa. Parecia simples mas o burro, de cada vez, achava a árvore a que o prendiam diferente e nunca a reconhecia. O pior foi ter descoberto mais tarde que nem a própria ameixoeira se reconhecia a si mesma e se perdia constantemente no vento. Sem saberem onde estavam, o burro carregava sempre e a ameixoeira não deixava de dar ameixas vermelhas. Depois de me ter apercebido disto nunca mais me importei com os lugares. Tomei então, desde logo, uma decisão que me ficou para o resto da vida: antes de achar que sei onde estou, perco-me e no movimento da procura encontro o que não estava à espera e o que não estava à espera é tão sensato quanto o burro branco do meu tio Manuel ou quanto a ameixoeira a que o prendiam todos os dias.

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