sábado, fevereiro 26, 2011

noites brancas

Não me lembro exactamente de nenhuma das nossas conversas que se prolongavam noite fora até vermos o sol nascer e essa madrugada ser de súbito um peso que se ia intrometer no dia e dificultá-lo. O próprio dia fazia-nos esquecer algo do que tínhamos partilhado: experiências, episódios por vezes ficcionados, sonhos, planos convictos que ambos sabíamos que não iriam sair dali.

Mais tarde, essas conversas que se prolongavam pela noite dentro, ganharam forma de discussões, discursos sob um manto falso de racionalismo, tentativas desesperadas de ser-se razoável, com direito às projecções das frustrações um no outro, aquilo que queremos que o outro seja e o pudor de dizê-lo directamente. Horas intermináveis a debatermo-nos com fantasmas, hipóteses mirabolantes para resolver e endireitar um estar já inerte, ameaças e grandes afirmações de carácteres, como se tivéssemos de resolver a vida inteira numa só noite, porque amanhã o dia nos ia trair e, portanto, era agora.

Única maneira que nos restava de estarmos perto: o combate cego de sentimentos desfeitos.

Era quando ficavas a olhar através de mim, não para mim, para coisas que tinham ficado esquecidas algures.

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