sexta-feira, dezembro 30, 2005

Ao longo do arame farpado


« Aquele que, ao longo do arame farpado, passa na estrada, pequena silhueta negra sobre a neve, é mesmo uma potência da terra. Mas se nos vê por detrás do arame farpado, se lhe acontece simplesmente pensar que outra coisa é possível na natureza que não o ser um homem que caminha livre na estrada, se se deixa levar a pensar assim, arrisca-se desde logo a sentir-se ameaçado por todas essas cabeças rapadas, por todas essas cabeças de que não tem chance alguma de alguma vez conhecer e que são para ele o que há de mais desconhecido sobre a terra. E esses mesmos homens contaminarão talvez, para ele, as árvores que circundam ao longe o arame farpado, e aquele que está na estrada correrá então o risco de se sentir sufocado pela natureza inteira, como recolhida sobre si. »

Robert Antelme, L’espèce humaine, [trad. minha], Gallimard, 1957, p. 79.

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